Espremido entre o mar e as montanhas, o Rio de Janeiro é uma cidade fragmentada em várias regiões com características e culturas próprias. Raiz de algumas das mais tradicionais escolas de samba, celeiro de artistas geniais, fábrica de trabalhadores tenazes, cenário de um famoso e democrático baile realizado debaixo de um viaduto, cuja marca registrada são as irresistíveis coreografias sincronizadas com a pulsante música charme, Madureira, lugar de gente simples e honrada, abriga algumas das pessoas mais incríveis que já conheci: tia Francisca, a benzedeira. Uma mulher preta, de baixa estatura, muito magra, com os cabelos totalmente brancos, da mesma cor dos seus vestidos, também conhecida por sua prosa elegante, quase poética. Desde que a conheço, ela mora em uma casa muito humilde e arrumada. Na sala perfumada pelas ervas do defumador – alecrim, beijoim e alfazema são as suas preferidas –, há um altar com as imagens de mestre Jesus, mãe Maria e São Jorge, o santo guerreiro. Ela recebe a todos sentada em uma desbotada poltrona azul, “da cor do manto de Nossa Senhora”. Com gestos naturalmente meigos, vive à disposição de quem necessita de uma reza forte para aliviar as aflições da alma. Valendo-se de galhos de arruda, que desliza pelo corpo dos suplicantes, com os olhos fechados, profere palavras oriundas do fundo do coração. Sem importar a dimensão do sofrimento, nunca vi ninguém sair daquela casa sem uma nesga de esperança nos lábios ou uma luz que antes inexistia no olhar. Aos que querem pagar pelo serviço, a velha senhora apenas sorri e diz: “Ajoelhe-se diante do altar e agradeça ao Nosso Senhor Jesus Cristo. A ele, toda honra e glória. A mim, nada é devido”.
A sua idade é um mistério. A sua aparência sempre foi a mesma desde que a conheci, ainda criança, levado pelas mãos do meu pai, preocupado com aquele garoto distraído que se encantava por horas com coisas sem importância. Eu gostava tanto da tia Francisca quanto da sua casa. Era como se entrássemos em um templo apartado do tempo e do mundo. O silêncio e a quietude daquele lugar inundavam de paz o meu coração. A reza me fazia bem, mas a breve conversa que tínhamos, logo após, era ainda melhor. Seguidas por um abraço acolhedor, as suas palavras mansas, doces e sábias, revelavam o lado bom das piores situações. Não apenas me serenavam o coração, mas também clareavam o meu olhar. A benzedeira sempre demonstrou uma sincera afeição por mim. Sem importar quanto tempo eu ficasse sem aparecer, quando a visitava, perguntava pelas péssimas notas de Matemática, matéria que eu detestava, e as boas notas de História, assunto que me fascinava. Depois, dava uma risada matreira e sussurrava para o meu pai não ouvir: “Não devemos gostar de algo só porque alguém gosta ou acredita que todos deveriam gostar. Não há duas pessoas iguais. Cada um é de um jeitinho, com a sua beleza, encanto e poder. Fugir disto é negar a magia que nos foi concedida”.
Adulto, continuei a frequentar a casa da boa anciã. No entanto, havia muitos anos que eu não a visitava. Por distração e descuido, retiramos da rotina afazeres fundamentais ao exercício da felicidade. Nada pior para nos afastar de quem somos e daquele que podemos nos tornar. Então, a felicidade míngua. Somente através da rotina é possível perfazer a rota rumo à Luz. Acreditava, pelo tempo transcorrido, que ela tivesse partido para as Terras Altas. Como a tia Francisca era avessa a telefones, redes sociais e outras modernidades, para saber, só havia uma maneira: era preciso ir a Madureira.
Para a minha alegria, tudo estava exatamente igual como da última vez. Tanto a tia Francisca como a sua casa. Não ousei me aprofundar nos mistérios do tempo. Trazia comigo outras preocupações mais urgentes. Por causa de sérias dificuldades financeiras que a editora atravessara, eu havia vendido metade das cotas da empresa. A lua de mel com o novo sócio foi breve. Ele logo implementou uma série de mudanças que entendia serem necessárias para reverter o fluxo de caixa negativo. Concordei com algumas. Não apenas concordei, mas também aplaudi. Não eram somente indispensáveis, porém, inteligentes e criativas. Contudo, de outras, não gostei. Uma delas, em verdade, me incomodou bastante. Começariam a publicar obras rasas, escritas por autores de ocasião, como celebridades instantâneas, guinchadas à fama em razão de escândalos, crimes midiáticos ou lançadas à estratosfera da popularidade pelas redes sociais, sem que tivessem praticado qualquer ação de valor justificável. Apesar do inegável apelo comercial, eram vazias de conteúdo artístico, pedagógico ou filosófico. Em poucos meses, restaria desfigurada a face da empresa que eu demorara anos para esculpir. Não se tratava de crítica ou preconceito com quem explorava esse filão, apenas não o queria para a minha editora. Fui acusado de intransigência, purismo e ingenuidade.
Depois de me ouvir sem nada dizer, tia Francisca me rezou. Em seguida, me abraçou por intermináveis minutos, como se conseguisse ouvir as palavras sensíveis do coração, impronunciáveis por lábios afoitos e aflitos. Ofereceu-me um pouco de água retirada de uma jarra que descansava no altar: “Está fluidificada, serve para trazer calma à alma”. Esperou que eu esvaziasse o copo e perguntou: “Como você entende o sucesso?”. Embora não tivesse alcançado o motivo do questionamento, respondi que o sucesso acontece quando o indivíduo alcança os objetivos desejados ou supera as próprias expectativas. A boa anciã continuou: “O que acontece se aquilo que foi conquistado for perdido por qualquer motivo?”. Ainda sem entender para onde ela me levaria com aquelas perguntas, disse que, nesses casos, do sucesso advém o fracasso. Ela prosseguiu: “Como podemos constatar o sucesso de uma pessoa?”. Expliquei que os critérios mais comuns eram a fortuna, a fama ou o poder político e social. A tia Francisca arqueou os lábios em leve sorriso e indagou: “O que acontece quando, por algum motivo, contrário ao nosso desejo, o dinheiro desaparece, a fama se esgarça ou o poder é usurpado?”. Respondi que do êxito advém a queda. E a queda é o mais cruel dos fracassos. É preferível não chegar ao topo a despencar dele. A benzedeira franziu as sobrancelhas e comentou: “O sucesso é assustador. Dá-me medo. Não o quero para mim”.
Tentei corrigir o raciocínio. Esclareci que fama, fortuna e poder eram os parâmetros comuns, não necessariamente os meus. Para mim, sucesso era ser feliz, digno e livre; amar demais e viver em paz. A boa anciã me olhou com compaixão e ponderou: “As verdades universais são indiscutíveis, e impressionam pela beleza da ideia. Entretanto, quase ninguém as transformam em ação. Exige esforço, abnegação e coragem para as aplicar ao cotidiano. Muitos poucos estão dispostos à mudança. Mudar dói. É preciso admitir erros, desconstruir falsas verdades e aceitar o esforço da reconstrução pessoal. Deixar para trás vícios de ser e viver que, de tão íntimos, acreditávamos imutáveis à personalidade, não é fácil”. Pedi para que explicasse melhor. Ela exemplificou: “Todos declaram desejar a paz no mundo. Acredito que sejam sinceros. No entanto, não a conseguem manter nem no próprio lar. Exigem que os outros ajam ao seu gosto, não toleram as diferenças, brigam quando são contrariados e amaldiçoam as verdades desconfortáveis. Consideram esses comportamentos como parte inevitável de quem são. Ninguém chega ao destino certo percorrendo a estrada errada”.
Bebericou um gole de café contido em uma pequena caneca de ferro esmaltado, que ficava pousada no chão, ao lado da desbotada poltrona azul, e comentou: “Tudo aquilo que pode ser tomado, perdido ou desparecer pela ação do tempo ou de alguém, está comigo, mas não é meu. É um empréstimo ou uma concessão. Em qualquer das hipóteses, se trata de uma experiência transitória cuja finalidade maior é a minha evolução. O que é meu, nada nem ninguém pode furtar, porque não envelhece nem enferruja. Não depende das leis, de sistemas políticos ou políticas econômicas. Não cabe contabilidade nem moldura, tampouco pode ser guardado em cofres ou serve como moeda no mercado. A origem da maior parte dos sofrimentos surge nas aflições das conquistas que se desmancham conforme às variações dos dias e do mundo, sem que possamos impedir. Essas, não cabem na bagagem rumo às Terras Altas. Sabemos disto, mas continuamos as atribuir como fundamentais ao sucesso”. Olhou-me com doçura e sussurrou como se contasse um segredo: “A uma pessoa, pertencem as virtudes que agregou à alma. Nem mais nem menos. Uma construção interna emanada em serenidade, equilíbrio e força de movimento”.
Franziu as sobrancelhas e alertou: “Falências, demissões, enfermidades, traições, calúnias, separações indesejadas por divórcio ou falecimento de entes queridos, são apenas alguns exemplos de situações que fazem o mundo ruir para muitas pessoas. O sucesso são os alicerces que nos mantêm de pé quando tudo ao redor desaba”. Deu de ombros e concluiu: “Caso não tenhamos erguido esses pilares interiores, ainda desconhecemos o sucesso. Se já os temos robustos, estamos livres para seguir em frente sem depender de quaisquer circunstâncias externas como fortuna, fama, privilégios, favorecimentos ou cargos de qualquer natureza. Nada nem ninguém poderá nos impedir de fluir por entre as adversidades dos dias. O sucesso intrínseco estabiliza, protege, ilumina, impulsiona e conduz. Os extrínsecos, embora tenham muito brilho, muitas vezes, carecem de luz”.
Perguntei como fazer para alcançar esse tipo de sucesso. A benzedeira me explicou: “Ao contrário da crença comum, não se trata do protagonismo em eventos extraordinários, palcos repletos de holofotes, contas bancárias polpudas, felicidade fabricadas através de fotografias perfeitas, viagens para lugares paradisíacos, posições de autoridade ou a presença em solenidades luxuosas que determinam uma existência repleta de êxitos. O sucesso é uma construção interna que nos faz viver com alegria, serenidade e clareza, equilíbrio e força de movimento, sem importar os acontecimentos ao redor”. Comentei que, a notar pelas palavras da anciã, se tratava de um poder muito valoroso e ao alcance de todos, pois dependia apenas da vontade de cada um. Questionei o porquê de estarmos tão distantes dessa importante conquista. Tia Francisca sorriu e lembrou: “Para encontrar e usufruir de algo, se faz necessário entender a busca e o propósito. Seja qual for. Quanto ao sucesso de profundidade, o que o impede são as pequenas permissões indevidas que fazemos no dia a dia, movidas pelo ímpeto dos desejos desvairados e interesses insensatos. Isso nos faz optar pelo brilho em detrimento da luz, na contramão da verdade e das virtudes. Sem perceber, todos os dias nos afastamos um pouquinho mais de quem poderíamos nos tornar”.
Franziu as sobrancelhas ao aumentar o tom da seriedade e comentou: “Esqueça a ideia de que estamos em um mal lugar por causa de alguém ou da má sorte. Cada um está onde se colocou. A queda não advém das más influências de alguns amigos ou da vizinhança. Damos ouvidos às palavras que nos afagam as afinidades. Cada um é responsável por si mesmo e pelas consequências a que deu causa. Ninguém tem o destino amaldiçoado. Somos o exato produto da nossa fábrica incessante de escolhas”.
Bebeu mais um gole de café antes de concluir: “Tampouco será justo atribuir o fracasso às grandes e repentinas catástrofes. Ninguém tropeça em montanhas, filho. A vida desaba mundo afora somente depois de ruir universo adentro. Isso leva tempo. O desperdício de uma existência acontece pouco a pouco, nas pequenas concessões diárias que autorizamos por interesses escusos, comodismo ou falta de coragem. Faz-se necessário reverter a rotina do relacionamento que cada um mantém consigo mesmo. Não há outro caminho para o sucesso”.
Fez uma breve pausa para eu concatenar o raciocínio e sugeriu: “A todo instante, traga à tona da consciência os sentimentos ocultos que movem as suas escolhas, pois, falam das genuínas intenções por trás de cada decisão. Nem sempre decidimos pelos motivos que gostamos de justificar e acreditar”. Em seguida, fez uma pergunta de simples retórica: “Entende quem nos afasta do verdadeiro sucesso?”.
Pela desnecessidade de resposta, acrescentou: “A análise sincera dos sentimentos que impulsionam ou restringem a razão é parte imprescindível à boa rotina. Reconheça, aceite e os transmute quando necessários. Assim definimos escolhas e destinos. As escolhas servem para confececionar as rotas que, por sua vez, nos aproximam ou afastam do genuíno sucesso. Os sentimentos revelam os comportamentos viciosos que nos levam a andar em círculos. Todos os sentimentos têm nome. Enquanto não os decodificar com exatidão, seguiremos sem entender as engrenagens da razão. Continuaremos sem compreender os autênticos fundamentos das nossas próprias decisões e o motivo de não conseguirmos sair do lugar, mesmo após tanto esforço. Ninguém entende para onde está indo antes de se conhecer mais e melhor. O sucesso de profundidade estará sempre ao largo de quem se recusa a fazer o movimento em direção ao próprio âmago. Encontrar a essência é compreender os genuínos sentimentos que movem os pensamentos, pois são essenciais no processo de expansão ou contração dos avanços existenciais. O sucesso ocorre como consequência natural desse entendimento, assim como das transformações indispensáveis ao refinamento dos alicerces interiores, indispensáveis ao enfrentamento das adversidades inerentes à vida”.
Olhou-me com seriedade e concluiu: “Sem entender o Caminho, na procura desenfreada por posições e privilégios de êxito aparente, não conheceremos a magia pessoal”. Indaguei no que consistia essa magia. Ela exemplificou para explicar: “A paz não é a ausência de tempestades. A paz está em se sentir sereno, equilibrado e forte durante as tempestades. Isto é sucesso. Não há magia mais poderosa”.
Tia Francisca estava certa. A genuína vitória jamais tratará de permissões e autorizações. Qualquer conquista cuja manutenção não careça do mérito, mas dependa das variações do mundo, pode se tornar um prêmio às avessas. Em verdade, o sucesso seria como uma nau, embora pequena – ou até mesmo invisível à crença de muitos –, foi muito bem-construída, se mostrando capaz de singrar com segurança e autonomia os mares incertos e traiçoeiros da existência. Envolve um conjunto de conquistas da alma. A ideia de movimentos internos dignos, livres e firmes o suficiente para sustentar os deslocamentos externos de acordo com o próprio olhar, gosto e vontade, possuí argumentos e encantos irresistíveis.
Contudo, ainda não tinha entendido como aquela conversa se aplicava ao problema que me atormentava na editora. Tia Francisca explicou: “O modelo de sucesso aparente se manifesta de diversas maneiras. Nem sempre está no desejo desenfreado por fama, dinheiro ou cargos de destaque investidos em poder. O exercício de controle e domínio entre familiares, amigos ou no ambiente de trabalho revela nuances desse poder de superfície. Nada há de errado em querer as coisas do nosso jeito. Errado é entrar em conflito quando contrariado. Temos o direito e a responsabilidade de conduzir as nossas vidas ao nosso jeito, movidas pelos interesses e sabores que nos são afins. Para isto, se faz necessário entender o limite da ação. Tanto o querer quanto a liberdade possuem fronteiras intransponíveis. Ninguém tem a obrigação de concordar ou acompanhar ninguém. Esta regra serve tanto para nós como aos outros. Se o assunto aborda questões íntimas, temos o direito de ficar ou partir, dizer sim ou não, fazer ou desfazer. Quando intercambia com o direito alheio, o diálogo e a sensatez se fazem necessários, sabendo que os outros têm interesses e desejos nem sempre iguais aos nossos. Podemos concordar ou discordar, porém, aceitar a escolha que pertence ao outro por direito, é ato de respeito. Acolher as diferenças de opiniões e paladares sem mágoa ou rancor é ato ainda mais nobre, seja pela dignidade contida, seja pela liberdade autoconcedida”.
Bebericou mais um pouquinho do café e argumentou: “O conflito de ideias exige diálogo para uma solução saudável. A diferença de olhares não trata de quem está certo ou errado. Uma comunicação clara, mansa e sincera serve para encontrar um ponto de luz na relação, onde os envolvidos podem ceder e conviver sem trair a própria essência. Sem vaidade e orgulho, com humildade e honestidade. Em relações assim, movidas pela boa vontade, jamais pode haver um perdedor ou um vitorioso. Ganhamos ou perdemos juntos. Estas são as regras básicas para vencer um jogo chamado sucesso”.
Argumentei que esse ponto de comunhão nem sempre é possível nas relações. Concessões precisam de limites para não se tornarem abusivas. Algumas pessoas não entendem isto. A boa anciã ponderou: “Quando um dos envolvidos prioriza o sucesso de superfície em detrimento ao de profundidade, movido por sentimentos que não consegue entender ou não deseja modificar, agirá movido por intenções ilegítimas ou impulsos desprovidos de qualquer virtude. Por desconhecer o inestimável valor da riqueza desamoedada e da verdade desapegada de obrigatoriedade, qualquer que seja o resultado, fará de si um perdedor, sem que ninguém o tenha empurrado para a derrota”. Olhou para a imagem do santo guerreiro no altar, como se buscasse inspiração, e comentou: “Pode-se partir para o mau conflito ou escolher o bom combate. Vencer o outro ou a si mesmo. O genuíno amor ao mundo exige desapego às coisas do mundo. A cada escolha definimos o tipo de sucesso que procuramos e, por consequência, o destino que nos aguarda”.
Mais uma vez, a boa anciã tinha razão. A minha editora não era só minha. O novo sócio era um bom homem, repleto de virtudes e tinha encontrado excelentes soluções para problemas sérios. Apenas tinha um olhar diferente do meu em alguns aspectos empresariais. Algo natural e não necessariamente ruim. Eu necessitava dialogar comigo mesmo para entender a fronteira entre o inadmissível e a implicância, entre a intolerância e o respeito, entre o orgulho e a humildade. Precisava entender se o problema estava em mim, nele ou em ambos. Depois, o convidaria para uma conversa franca, porém, gentil. Algo em mim me dizia que encontraríamos o ponto de luz: um lugar no coração onde poderíamos conviver bem e em paz, apesar das inevitáveis diferenças. Apenas pensei, sem nada dizer à tia Francisca.
A benzedeira sorriu e, como se adivinhasse os meus pensamentos, me pediu um abraço. Ela queria ouvir o meu coração apenas para confirmar o que já sabia. Em seguida, disse: “A vaidade concede a ilusão do sucesso. Por isto é tão difícil vencê-la. Entre outras características, a vaidade se manifesta no desejo exacerbado de ter razão sobre todas as coisas e assuntos. Uma tentativa inútil de preencher um vazio existencial que continuará a distorcer comportamentos e escolhas enquanto não for compreendido. Seguirá acreditando que os aplausos, a subserviência e as reverências suprirão a falta de algo que, por mais que procure, jamais encontrará no mundo. O que preenche o vazio interior é o entendimento cada vez mais apurado sobre si mesmo envolvido em bons sentimentos. Nada mais servirá”.
Segurou nas minhas mãos com ternura e finalizou a conversa: “O genuíno poder está na riqueza dos elementos construtores da consciência. Quando os descobrir e os trouxer à tona da vida em forma de virtudes no trato consigo mesmo e com toda gente, terá acesso à magia pessoal. Um jeito de atravessar os dias com autenticidade e originalidade, mas também com leveza e suavidade. Em outras palavras, sem abdicar dos seus valores e direções, conseguirá se mover sem conflitos, mágoas, culpas ou medo. Ainda que menosprezados ou incompreendidos, apenas esses conhecerão o sucesso”.
A reza terminara. Agradeci o benzimento com um beijo estalado na bochecha da tia Francisca e fui embora. Como as demais, aquela visita me fizera muito bem. Eu saí dali levando comigo o encanto de encontrar alegria e beleza onde antes só havia agonia e tristeza. Além de duas certezas. Uma, é que quando o conflito é iminente, significa que quase sempre há uma rota disponível ainda não percebida. É o caminho para o sucesso, ou, se preferirem, a rota da luz. Se sucesso e luz não estiverem alinhados, a estrada está errada. A outra certeza, é que eu precisava voltar mais amiúde a Madureira.
