MANUSCRITOS VI

A minha vida não tem solução

Dai-me o pão de cada dia, diz um dos versos da conhecida oração. Não apenas o alimento necessário à sobrevivência, porém, também o pão da transcendência, aquele que irá nutrir a alma. Precisamos de ambos. Contudo, nem sempre nos damos conta da refeição espiritual oferecida. Muitas vezes, mesmo diante de uma mesa farta, torcemos o nariz por falta de apetite. Diferente do pão que alimenta o corpo, degustar o pão da alma requer percepção, sensibilidade e, acima de tudo, vontade. Noutras, além dos atributos citados, também se faz necessário a valiosa criatividade, fundamental para que passemos a observar os acontecimentos por ótica diversa e, assim, fazer de um jeito nunca antes pensado. Do contrário, sem darmos conta das deliciosas iguarias que temos à disposição, seguiremos esfomeados. Modificar a maneira como vivemos é o único jeito de mudar a realidade. Como na matemática, esta é a equação da vida que nos conduzirá a solução de cada problema existencial. Seja qual for. Contudo, a essencial transformação espiritual, aquela que transformará a nossa maneira de ser e viver, exige muita vontade e dedicação. Ao contrário do pão do corpo, já pronto e disponível nas prateleiras dos mercados, bastando pegar, pagar e levar, o alimento do espírito costuma necessitar de uma cuidadosa preparação”, comentou Canção Estrelada, o xamã que tinha dom de perpetuar a filosofia ancestral do seu povo através das histórias e das músicas.

Na varanda da sua casa, em Sedona, nas montanhas do Arizona, enquanto conversávamos, ele colocava fumo no fornilho de pedra vermelha do seu indefectível cachimbo, embalado no vai e vem da cadeira de balanço. O xamã ilustrou: “Vejo as pessoas chegarem aqui em busca dos cerimoniais mágicos. Querem a transformação através dos fenômenos interdimensionais, do rufar dos tambores, das ervas purificadoras, das fogueiras transmutadoras, das cantigas ancestrais, das rezas secretas, mas poucos estão dispostos a fazer a parte que lhes cabe. Justamente a principal”. Esperou o fogo queimar o fumo, baforou algumas vezes antes de prosseguir: “Os rituais sagrados são preciosíssimos, seja pela harmonização da aura e sintonização com as faixas astrais mais sutis de existência, seja pelo refinamento da percepção e da sensibilidade indispensáveis à transformação pessoal, ou ainda, pelas palavras orientadoras oferecidas. No entanto, um cerimonial, assim como o mais poderoso dos livros, por si só, não muda ninguém. Serve apenas para sinalizar uma rota evolutiva. Cabe ao viajante das estrelas percorrê-la com os próprios pés. Não há outro jeito”.  

Franziu as sobrancelhas e disse: “A maioria deseja as mudanças por intermédio da facilidade instantânea dos milagres. Poucos estão dispostos ao longo, porém indispensável, esforço da transformação”. Deu de ombros e vaticinou: “Enquanto não houver movimento de elaboração interna, nada mudará”. A conversa foi interrompida pela chegada de uma das suas sobrinhas. Com ela, veio uma amiga, a jovem Mary, que precisava de ajuda para encontrar a saída do labirinto existencial no qual se sentia perdida. Com a sua gentileza habitual, Canção Estrelada pediu para que se sentassem e ficassem à vontade para falar. A moça confessou viver uma situação muito complicada. O seu casamento chegara ao fim. A relação estava insuportável. Nem tinham mais vontade de brigar, explicou. Conviviam como dois estranhos em uma mesma casa. Conversavam somente o indispensável, como as compras e as contas a serem pagas. Mesmo assim, com a menor quantidade de palavras possíveis. Uma atmosfera horrorosa, admitiu. Estava disposta a sair de casa. Ocorre que o seu salário não era suficiente para bancar um aluguel, além das outras despesas inerentes à sua manutenção pessoal. Enfim, não queria ficar nem tinha para onde ir. Já tentara empregos melhores sem que tivesse sucesso. Embora pudesse pedir acolhida temporária na casa de um parente ou amiga, não se sentia à vontade na casa de ninguém. Estava em labirinto existencial. Ainda mais grave, era um labirinto sem nenhuma porta. Não havia saída. Precisava do auxílio de outras esferas dimensionais. Por isto estava ali.

Com o olhar sereno e acolhedor, Canção Estrelada ouviu todos os lamentos sem dizer palavra. Quando a jovem, ao terminar de expor, acrescentou não haver solução para os seus problemas, o xamã continuou em silêncio. A sobrinha instou o tio a se pronunciar. Com a tranquilidade de sempre, típica daqueles que sabem que todas as tempestades não apenas passam, mas também servem para modificar a paisagem árida, se não aparente, mas na profundidade das raízes, ele baforou o cachimbo e comentou: “Se a jovem afirma não haver solução para a sua vida, nada me resta fazer”. Esperou que a fumaça se dissolvesse no ar antes de acrescentar: “Faz-se necessário acreditar que todo labirinto tem uma saída. Do contrário, será impossível encontrá-la”.

A sobrinha se mostrou indignada com a postura insensível do tio. Mary ficou com os olhos marejados e de declarou abandonada pela sorte. Disse não entender a razão de tanto infortúnio em sua vida. Tentei ajudar. Expliquei que ao acreditarmos que sempre existe uma solução para qualquer problema, estimulamos a criatividade, um atributo tão importante na arte quanto na vida. Citei um antigo sábio que ensinava a necessidade de desenhar uma porta onde até então existia somente um muro. Depois, criaremos a realidade para que ela se abra.

As moças disseram que as minhas palavras eram bonitas, porém, inúteis. Não se cria a realidade com poesia, disseram. Foi quando Canção Estrelada nos surpreendeu: “Vou ajudá-las. Estejam aqui amanhã cedo”. A sobrinha salientou que apenas a Mary precisava de auxílio. O xamã a corrigiu com uma mistura de doçura e firmeza em seu tom de voz: “Ambas necessitam. Assim será feito”. Satisfeitas, as jovens agradeceram, prometeram voltar no dia seguinte e se foram. A sós, questionei o que ocorrera para que mudasse a sua opinião e decidisse por ajudá-las. Ele esclareceu: “Nada mudou. Apenas as fiz entender a importância da esperança. Amanhã vou mostrar o valor da fé”. Falei que não tinha entendido. Canção Estrelada explicou: “Na ânsia de sair, muitos tentam abrir as portas do labirinto movendo-as para o lado de fora”. Tornou a baforar o cachimbo e concluiu de modo enigmático: “No labirinto da vida as portas se abrem para dentro. A saída está no âmago do próprio problema. Nunca fora dele. A vida forma sábios, jamais super-heróis”.

Não tive certeza se havia entendido o raciocínio. Esperava que no dia seguinte tudo se tornasse mais claro. Somente à noite, ao me deitar, me dei conta de um detalhe; era sexta-feira. Nas manhãs de sábado, dezenas de pessoas se reuniam sob a copa do carvalho que havia no quintal da casa do xamã para ouvir as lindas histórias que narravam a filosofia ancestral do seu povo. Um pequeno cerimonial sagrado que se tornara tradicional em Sedona. Era comum virem pessoas de cidades próximas, como Cottonwood, Jerome ou Flagstaff. 

Logo cedo, eu ainda bebia a primeira caneca de café da manhã, quando as moças chegaram. Elas estavam bastante animadas com o ritual que participariam, no qual teriam acesso a portas até então inimagináveis. Delicado, Canção Estrelada as convidou a compartilhar do nosso desjejum. Elas aceitaram e se sentaram à mesa conosco. Como eu tinha refletido sobre a difícil situação da Mary antes de adormecer, aproveitei para sugerir algumas alternativas que pudessem servir de saída para os seus problemas. À medida que as expunha, eram rechaçadas de imediato. Uma após outra, as soluções pareciam contaminadas pelo fracasso ainda em sua semente. Nenhuma das ideias que propus teve chance de alçar nem mesmo um voo rasante. Como um franco atirador que tem na mira todos os pássaros possíveis, a jovem abatia as ideias assim que mostravam as asas. Todas as saídas estavam bloqueadas ou eram impossíveis de transpor. Esgotado, admiti que a vida da Mary não tinha solução. Em silêncio, Canção Estrelada apenas observava.

Foi quando as pessoas começaram a chegar para o cerimonial no quintal da casa. Espalhavam-se pelo gramado, aproveitando o sol do outono que acariciava o corpo e afugentava o frio da manhã. Havia uma atmosfera de alegria proporcionada por aqueles memoráveis encontros. No entanto, as jovens estranharam o movimento. Embora soubesse das tradicionais reuniões de sábado, a sobrinha acreditou que o tio cancelaria o encontro daquele dia para que realizassem um ritual sagrado no alto da montanha ou à beira do lago, como já participara de alguns. Canção Estrelada explicou que sagrado é tudo aquilo que abre a possibilidade para nos tornamos pessoas melhores: “Para tanto, vale mais o amor do que a liturgia”. Pediu para que as moças, ao se juntarem aos demais no quintal, o fizessem por inteiro: “Nada de vocês deve faltar ou transbordar. Do contrário, não terá serventia”. Em seguida, desfez a frustração que se avizinhava: “Magia é transformação. Se os seus corações estiverem presentes, haverá um lindo cerimonial mágico nesta manhã. Senão, somente ouvirão uma história. Nada mais”. 

Após uma rápida troca de olhares, as jovens se dispuseram a participar integralmente do pequeno ritual. Sentado em uma poltrona debaixo do carvalho, Canção Estrelada rufou o seu tambor de duas faces. Uma suave cantiga em dialeto nativo serenou os ânimos e rogou por proteção aos guardiões responsáveis pela egrégora da casa. Em seguida, iniciou a narrativa: “Em uma época da qual não há registros, havia uma aldeia liderada por um xamã sábio, justo e amoroso. Como tinha o respeito e a admiração de todos, orientava sem obrigar ninguém a seguir os seus conselhos. A autodeterminação era respeitada como método educativo, cabendo a cada um se responsabilizar pelos efeitos dos seus atos. Mérito ou demérito tinham as consequências premiadoras ou reparadoras. Inexoravelmente. Embora fosse um período de fartura, tanto a caça quanto a colheita eram abundantes, intuiu que o inverno daquele ano seria bem rigoroso e mais prolongado do que o usual. Seriam dias difíceis. Pediu que se realizasse um mutirão para a construção de um grande celeiro, onde guardariam os grãos e outros alimentos. Sendo que as frutas deveriam antes passar por um processo de secagem e a carne seria defumada, evitando que estragassem durante o armazenamento. Contudo, ninguém deu importância ao pedido do xamã. Fosse porque tinham afazeres mais importantes e poderiam iniciar a construção no dia seguinte, pois ainda faltavam muitas luas para a chegada do inverno, fosse porque acreditavam não haver tanta necessidade em terem o celeiro. Um esforço desnecessário. Afinal, tinham vivido bem até então, indo buscar na floresta tudo aquilo que precisavam. Bastavam fazer o que sempre tinham feito. Nenhuma mudança se fazia necessária”.

Diante da plateia atenta, Canção Estrelada seguiu com a história: “Aquele inverno foi mais rigoroso do que nunca. Estendeu-se por uma maior quantidade de luas; a temperatura esteve tão baixa que fez a floresta ficar branca. Nas árvores, nenhuma folha. Tampouco, frutas. As sementes não encontravam calor para germinar. O solo estava congelado. Os animais sumiram. Os bravos guerreiros da tribo andavam por dias em busca de caça ou mesmo de uma fruta. Na volta, em seus alforjes havia somente desânimo e cansaço. A aldeia conheceu a fome. Como uma entidade tenebrosa, a fome é cruel e atormenta a todos. Surgiu o desequilíbrio, os conflitos se apresentaram. Os aldeões se acusavam mutuamente por passarem por aquele sofrimento. Cada pessoa tinha a sua justificativa para se escusar da responsabilidade por não terem erguido o celeiro. Por estar ocupada com outra importante atividade, não podia cuidar de todas as necessidades da aldeia; contudo, os outros poderiam ter colaborado na construção. Com variadas, porém insignificantes variações, era o argumento de todos”.

A narrativa prosseguiu: “Sem saber quando o inverno teria fim, se que é terminaria um dia, as discussões e brigas se avolumaram. Vários aldeões já duvidavam se haveria uma nova primavera. Desde crianças conheciam histórias muito antigas de longos períodos que a Mãe Terra permaneceu sob o gelo. Outros, acreditavam que os seus ciclos naquele local havia se encerrado; aquele inverno era um recado do Grande Criador para que fossem buscar a prosperidade em terras distantes. Agoniados e famintos, a maioria dos habitantes se mostrava disposta a partir. Escolheram representantes dessas famílias, formaram uma comissão, e foram comunicar a decisão ao xamã. O líder da aldeia os ouviu com enorme paciência. Depois, os lembrou que todos sempre foram livres para dirigirem a própria vida. Era um princípio inalienável que continuaria a orientar aquela tribo. Desejou que o Grande Criador os protegesse durante a peregrinação. Em seguida, perguntou para onde eles iriam. Disseram que seguiriam para o Norte. Alguém da própria comitiva lembrou das perigosas cordilheiras que se situavam nessa direção. Não conseguiriam passar enquanto o inverno perdurasse. Falaram de ir para o Sul. Outro dos aldeões os fez considerar quanto ao enorme rio que havia ali, com suas águas revoltas e redemoinhos traiçoeiros, capaz de sugar uma charrete com muitos cavalos num piscar de olhos. Ponderaram ir para o Leste. Uma ideia logo descartada, pois teriam de atravessar um longo e insalubre deserto. Ninguém sobreviveria. Restava o Oeste. Uma direção impossível por terem de atravessar o território de tribos extremamente selvagens e hostis. Discutiram por longo tempo. Agressivos no início, resignados ao final. Não temos para onde ir, decretou um dos integrantes da comitiva”.

Canção Estrelada observou as pessoas sentadas no gramado por alguns instantes e continuou: “O líder da aldeia os fez recordar: Quando não sei para onde ir, não raro, significa que, apesar de eu estar insatisfeito, o meu coração quer ficar. Pois se a vontade de partir é sincera, os obstáculos serão vistos como desafios a serem superados. Na imaturidade da vontade, quando em verdade se trata de uma fuga, nunca de um caminho, os obstáculos se mostrarão como empecilhos intransponíveis”. Um dos aldeões perguntou ao xamã qual a diferença entre uma fuga e um caminho. Ele respondeu: “O trato sincero com a própria verdade. Então, a vontade se mostra madura, corajosa e equilibrada. Nada nem ninguém será capaz de me impedir de seguir em frente. Assim, no exercício efetivo das minhas escolhas revelo a verdade que há e também aquela que ainda não existe em mim. Tudo mais são apenas palavras sem o devido amadurecimento no solo fértil da verdade, seja por falta de tempo, seja por ineficácia da semente”.

A história entrou no último capítulo. Canção Estrelada contou: “Um ancião, membro do Conselho de Sábios da aldeia e amigo pessoal do xamã, que conversava com ele quando a comitiva entrou, e tinha assistido à reunião, comentou que a ideia de ir embora da aldeia surgira após a fome. Não apenas a falta de alimento do corpo, mas mostrava também a desnutrição daquelas almas. Como tinham se esquivado da construção celeiro, fato que teria evitado aquela situação difícil, tentavam agora fugir da realidade que acabaram por construir. Eles eram o resultado das suas próprias equações. Enquanto não olhassem para si, não encontrariam nenhuma solução. Nem lugar serviria pela inadequação que não compreendiam”. 

Canção Estrelada prosseguiu: “Um dos aldeões lembrou sobre os sinais enviados pelo Grande Criador e falou sobre o aviso de partir. O ancião explicou que as dificuldades que encontramos no mundo refletem as incompreensões sobre quem somos; estas incompreensões embaçam a leitura da vida. Daí, as dificuldades. Ele esclareceu: Os dias se tornam mais complicados à medida que nos eximimos das responsabilidades de construção. Quando a vida parece não ter solução, revela que erramos na equação. Meramente mudar a equação na tentativa de encontrar a solução é um erro comum e vulgar. Para cada situação existe a exata equação. Tem a hora de mudar e o momento de refazer. Entenda a si mesmo para saber se tratar de substituição ou caso de reelaborar a equação.Um dos aldeões quis saber qual era a opinião do ancião. Ele a ofereceu: Nesse caso, refaçam a equação. A solução sempre se oculta dentro do problema; nunca fora dele. Enquanto justificarem os próprios erros nos erros dos outros, nenhuma porta se abrirá. Acolham amorosamente os seus equívocos e omissões. Aceitem-se com compaixão, humildade e simplicidade. Parem com as acusações recíprocas; elas são incapazes de indicar uma verdadeira saída. Por isto se enganam mutuamente e ficam sem direção. Usem o passado e os erros não como objetos de acusação, mas como fontes de sabedoria. Apoiem-se para compreender de qual maneira deverão fazer daqui por diante. Projetem, planejem, desenhem a porta que atravessarão. Que cada um se preocupe menos com que o outro deixou de realizar e se concentre mais naquilo que poderá fazer. Sem necessidade de qualquer discurso; use o bom exemplo para levar o faltoso a rever a própria postura. A suavidade da verdade traz a força, o poder e a magia para a construção da realidade. Façam e refaçam até encontrarem o melhor jeito. Na alegria de um dia qualquer, na distração das horas bem aproveitadas, se darão conta que a porta desenhada tomou forma e se tornou real. Ainda mais, ela seu abriu!”. 

O ancião aproveitou para lembrar: Mas tenham compromisso para que haja amor. Vida sem compromisso mostra um amor de superfície; nenhuma solução será alcançada. O desenho no muro se apagará. Não haverá porta para atravessar nem caminho para seguir”.

Em seguida, Canção Estrelada finalizou a história: “A aldeia nunca esqueceu aquele inverno. Precisaram de união e esforço em uma intensidade nunca antes ousada. O celeiro construído na primavera seguinte se tornou o símbolo de evolução e prosperidade da tribo. Reza a lenda que nunca mais ficou vazio. Foram dias rigorosos que ensinaram a todos sobre a importância das exatas equações para as corretas soluções. Contudo, isso somente se mostrou possível quando passaram a se mover por amor. Assim, compreenderam que a porta do labirinto, aquela que nos levará à saída, está travada para fora para que seja aberta para dentro. O que eu posso fazer? Uma pergunta que, quando feita com sinceridade e coragem, torna a minha equação revolucionária. O que os outros deixaram de fazer? Uma indagação escapista que me impede de encontrar a solução de qualquer equação”. 

E abriu os braços como fazia quando chegava ao fim de uma das suas histórias.

Aplausos emocionados. As pessoas sentadas no gramado sabiam como aquela singela história se encaixava em suas vidas. Cada qual com as suas peculiaridades. Mary tinha as faces banhadas em lágrimas. Foi a última a se levantar. Somente depois que todos se foram, ela se aproximou. Agradeceu muito. Disse saber que agora tinha um lugar para onde ir. Iria para casa. Tudo desmoronara porque o marido e ela, ao invés de cada um fazer o que poderia, passaram a esperar que o outro fizesse a sua parte antes. Nada de bom acontecia. Uma espiral descendente de incompreensão e inadequação mútua. Falou que o chamaria para uma conversa. Acreditava haver amor entre eles. Um amor que estava escondido atrás de muitas brigas. O convidaria a desenhar uma porta, por trás da qual encontrariam o amor esquecido. Entendeu que não achara lugar para ir porque o seu coração queria ficar. Havia um celeiro a ser construído em seu casamento, onde sempre haveria amor para os sustentar durante os invernos da existência. Igualmente emocionada, a sobrinha também agradeceu ao tio. Tinha compreendido as raízes de muitas das suas revoltas. Compreendera como fazer para solucionar os seus problemas dali por diante. Deram um beijo estalado nas bochechas do xamã e saíram saltitantes como duas meninas que descobriram que podiam tratar os próprios machucados. Tinham reconquistado a alegria e encontrado o poder da vida.

A sós com o meu velho amigo, comentei sobre a bela lição contida naquela história acerca do pão espiritual que nos é servido diariamente, mas que sem o devido preparo se torna impossível de ser apreciado. Seguiremos esfomeados. No entanto, me lembrei que ele havia dito que ensinaria as moças sobre esperança e fé. Disse que ele esquecera dessas questões em sua narrativa. Canção Estrelada fez não com a cabeça e esclareceu: “A esperança surge quando desenhamos uma porta na parede do labirinto. Ao entender que essa porta se abre para dentro, descobrimos a saída do labirinto e, pasmem, encontramos o mundo. Assim, a porta desenhada se torna realidade”. Fez uma pausa antes de concluir: “Este se movimento se chama fé”.  

8 comments

Rosana julho 2, 2021 at 3:29 pm

Gratidão Yoskhaz❣️🙏🏻

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Terumi julho 3, 2021 at 7:45 pm

Gratidão 🙏

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Viviane Barbosa julho 4, 2021 at 11:53 am

Nossa que interessante e incrível foi esse texto.
Esse realmente foi um recadinho básico do universo pra mim. Hauhau.

Estou transbordando gratidão. Ahooo

Amor e luz a todos nós!!!

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Marcel julho 4, 2021 at 9:59 pm

Gratidão!!

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Maristela H. da Silva julho 7, 2021 at 10:40 am

Falo para o meu marido toda vez que leio os teus textos “Como pode traduzir tão bem em palavras o que a alma quer falar?”

Gratidão por cada experiência compartilhada. Saiba e sinta que faz diferença cada texto compartilhado! É alimento para a alma!

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SCHWEITZER julho 8, 2021 at 2:28 pm

A saída do labirinto esta dentro de nos. Genial meu querido. Genial.

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Fernando julho 8, 2021 at 7:06 pm

Gratidão profunda e sem fim

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Paulo Vitor Alves dos Santos outubro 23, 2021 at 8:31 am

Mais um texto incrível e pontual.
Obrigado por isso 🙏🏾❤

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